No julgamento do Recurso Especial 2.007.941 – MG, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu que, ao tomador de empréstimo que se manteve inadimplente, é impossível a quitação do débito e a retomada do financiamento após a consolidação da propriedade em nome do credor fiduciário, sendo-lhe assegurado o direito de preferência na compra do imóvel que serviu de garantia do financiamento.
O Recurso Especial foi interposto em ação anulatória de ato jurídico ajuizada por empresa que tomou empréstimo de banco privado, dando o imóvel em garantia e sustentando que o credor teria praticado irregularidades no procedimento de expropriação do imóvel, uma vez que não lhe deu a oportunidade de reaver o bem ou de discutir a dívida, ante a recusa em renegociá-la na via extrajudicial e em receber os valores necessários para purgação total da mora e reestabelecimento do contrato. Suscitaram entendimento jurisprudencial autorizador da anulação e/ou impedimento da consolidação da propriedade diante da irregularidade da execução extrajudicial, bem como da possibilidade de purgação da mora, o que teria amparo no Decreto-Lei 70/1966 e que permite a purgação da mora a qualquer momento, até a assinatura do auto de arrematação. A ação foi julgada improcedente em primeira instância e confirmada pelo Tribunal de origem, que decidiu pela impossibilidade de purgação da mora após a consolidação da propriedade em nome do credor, com fundamento na Lei 13.465/2017.
Em suas razões, o devedor recorrente apontou pela violação do art. 34 do Decreto Lei 70/1966 e pela inaplicabilidade da Lei 13.465/2017, além do dissídio jurisprudencial que lhe autoriza a purgação da mora até a assinatura do auto de arrematação do bem levado a leilão, sendo quel tal garantia não teria sido observada pelo credor, conduta esta que teria sido admitida como regular pelo Tribunal de origem.
Ao decidir pelo improvimento do Recurso Especial, a Terceira Turma do STJ proferiu acórdão analítico e didático:
(i) A respeito da possibilidade ou não da purga da mora pelo devedor quando já ocorrida a consolidação da propriedade fiduciária do bem imóvel na pessoa do credor, destacou precedente jurisprudencial (REsp 1.649.595/RS, julgado em 13/10/2020), que reconhece a aplicação da Lei 13.465/2017 aos contratos anteriores à sua edição, considerando, ao invés da data da contratação, a data da consolidação da propriedade e da purga da mora como elementos condicionantes, firmando as seguintes teses: “i) antes da entrada em vigor da Lei 13.465/2017, nas situações em que já consolidada a propriedade e purgada a mora nos termos do art. 34 do Decreto Lei 70/1966 (ato jurídico perfeito), impõe-se o desfazimento do ato de consolidação, com a consequente retomada do contrato de financiamento imobiliário; ii) a partir da entrada em vigor da lei nova, nas situações em que consolidada a propriedade, mas não purgada a mora, é assegurado ao devedor fiduciante tão somente o exercício de direito de preferência, previsto no § 2º-B do art. 27 da Lei nº 9.514/1997).”
Portanto, para o STJ, a Lei 13.465/2017 pode ser aplicada aos contratos anteriores à sua edição, pois são consideradas as datas da consolidação da propriedade e da quitação do débito, e não a data da contratação do empréstimo, o que modificou o entendimento pretérito das turmas de direito privado, segundo o qual era, de fato, possível a purga da mora até a assinatura do auto de arrematação com fundamento no artigo 34 da Lei nº70/1966, às operações de crédito compreendidas no sistema de financiamento imobiliário, no âmbito da Lei 9.514/1997, restando assegurado o direito de preferência na compra do imóvel que serviu de garantia do financiamento.
Fonte: REsp 2.007.941-MG

Data: 12/05/23